O povo egípcio, de 1981 até hoje, vive sob uma Lei de Emergência e um regime de ditadura militar, ferramentas do governo de Mubarak para atropelar direitos básicos e restringir a liberdade garantida pela Constituição egípcia, o que levou à perda do sabor de se viver num Estado democrático de Direito.
Por Mohamed Habib
Os egípcios perderam os seus direitos políticos e estão privados das mínimas condições para uma vida com o mínimo de dignidade, vitimados por uma profunda exclusão social, com 40% da população abaixo da linha da pobreza, serviços básicos de saúde, de educação, de habitação e de saneamento totalmente deteriorados, além da absoluta escassez de empregos e a economia do país estagnada.
Foi o sofrimento que, no dia 25 de janeiro, revoltou o povo do Egito, num levante popular pacífico e espontâneo, sem planejamento e sem organização, com centenas de milhares de universitários concentrando-se na praça da Libertação.
Logo depois, marchas e passeatas, também pacíficas, reuniram em um só dia milhões de manifestantes em diferentes cidades, todos com o mesmo grito: "Basta, chega, vá embora, Mubarak. Precisamos respirar o ar da democracia e beber a água da dignidade".
Não surpreende ver na TV os atos violentos e criminosos cometidos pelo governo e por gangues paramilitares contra os manifestantes civis na praça da Libertação, matando dezenas e ferindo milhares.
Nos 30 anos de ditadura de Mubarak, eliminaram-se todas as organizações oposicionistas. No Egito não existe um verdadeiro partido de oposição ideológica, incluindo a Irmandade Muçulmana.
Mubarak criou um Parlamento fantoche, para poder alterar a Constituição do país e perpetuar-se no poder, além de legalizar a prisão e a tortura de ativistas e cidadãos sem julgamento. Por isso, não mais emergiram novos pensadores e intelectuais, dentro e fora do país, capazes de reerguer o povo egípcio, dignificando-o e fazendo jus à sua história milenar.
Para que o Egito se recupere, é fundamental, tal como o mesmo povo fez em 1952, extrair o ditador do poder, formar um governo transitório, representativo de todas as forças políticas e pensamentos existentes, elaborar nova Constituição e realizar eleições livres e diretas para a formação de um novo governo e de um novo Parlamento.
A opinião pública internacional deve estar atenta às manobras do ditador Mubarak para se manter no poder, com o apoio dos EUA e de Israel, sob o pretexto de que ele é fundamental para defender os seus interesses no Oriente Médio.
Concordo que o povo egípcio apoia o interesse dos dois países, mas com a diferença de que sejam incluídos na negociação os seus próprios interesses e que os seus direitos sejam respeitados.
Também é necessário investigar como o ditador, sua família e outros membros do regime acumularam, criminosamente, fortunas de bilhões de dólares, hoje espalhadas em bancos na Europa e nos EUA, repatriando-as aos cofres públicos do Egito, para que sejam utilizadas na recuperação do país.
Finalmente, é fundamental a imediata instalação de tribunal civil, com a participação de observadores de tribunais internacionais, para investigar e julgar os crimes cometidos pelo regime de Mubarak, que tirou as vidas de milhares de jovens, ferindo todas as leis e códigos internacionais de direitos humanos, contra milhões de egípcios.
* Mohamed Habib é professor titular e pró-reitor de extensão e assuntos comunitários da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas). Cursou a graduação e o mestrado na Universidade de Alexandria (Egito).
Fonte: Folha de S.Paulo
Retirado do site: http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=147007&id_secao=9