Os tunisianos começaram a votar no domingo 23, num clima de grande emoção, nas primeiras eleições livres da história do país para eleger uma assembleia constituinte e virar a página da era Ben Ali, expulso em janeiro passado por uma revolução popular depois de 23 anos no poder.
“Não fechei o olho a noite toda de tanta emoção por poder votar hoje pela primeira vez em minha vida”, declarou à AFP Houcine Khlifi, de 62 anos, enquanto esperava desde as 6h da abertura do entro eleitoral de Túnis.
A eleição foi iniciada na quinta-feira com a votação dos tunisianos que vivem no exterior, e que votaram em consulados e embaixadas durante três dias até este sábado.
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A imolação, em 17 de dezembro, de Mohammed Buazizi, jovem vendedor ambulante de Sidi Bouzid (centro-oeste), provocou um levante popular que inicialmente ninguém imaginou que levaria à queda do regime 28 dias depois.
O presidente Ben Ali, fortemente apoiado pelas grandes potências ocidentais por seu suposto papel de baluarte contra o islamismo e de líder do “milagre econômico” tunisiano, fugiu do país em 14 de janeiro para se refugiar na Arábia Saudita.
Depois de um período de tensa transição, marcado por greves e explosões de violência, os tunisianos encerram no domingo o primeiro capítulo da revolução, ao eleger uma Assembleia Constituinte de 217 membros.
No total 7,3 milhões de eleitores potenciais devem pronunciar-se frente a cerca de 1.500 listas de partidos e pessoas independentes que, em linhas gerais, declaram os mesmos valores de liberdade, democracia e justiça social.
A futura assembleia terá como tarefa principal a redação de uma nova Constituição, a terceira na Tunísia depois das de 1861 e 1959. Ela elegerá também um presidente provisório que designará um primeiro-ministro para a liderança de um governo de transição que permanecerá até a realização de eleições gerais.
A eleição foi organizada por uma comissão independente que atua no lugar do Ministério do Interior, desqualificado pela fraude eleitoral que praticou durante anos.
O modo de eleição proporcional foi adotado para favorecer os pequenos partidos entre centenas que apareceram desde janeiro.
O partido islâmico Ennahda, ilegal durante longo tempo, é o grande favorito segundo as pesquisas. Frente aos temores que gera, divulgou uma imagem de moderado e propõe um governo de ampla unidade “onde todos os tunisianos serão representados”.
O Partido Democrata Progressista (PDP, centro-esquerda), cujo líder, Ahmed Néjib Chebbi, havia enfrentado diretamente Ben Ali, apresenta-se como a principal alternativa frente ao Ennahda.
O Ettakatol (Fórum), próximo ao Partido Socialista francês, é conduzido por seu líder Mustafah Ben Jaafar.
Na esquerda, o Pólo Democrata Modernista, Ettajdid (ex-comunista), reúne cinco pequenas formações em torno de um projeto laico.
O Partido Comunista dos Operários Tunisianos (PCOT, extrema-esquerda) é conduzido por Radia Nasraoui, renomada advogada e mulher do líder PCOT Hamma Hammami. É uma das poucas mulheres que lideram uma lista, apesar da obrigatória paridade entre homens e mulheres.
Outra das forças é formada pelos herdeiros declarados ou não da União Constitucional Democrática (RCD), partido de Ben Ali dissolvido após sua queda.
Um número importante de “independentes” que se apresentam traduz, segundo os especialistas, a desconfiança frente aos partidos suspeitos de querer se aproveitar dos frutos de uma revolução da qual não foram promotores.
A grande incógnita dessas eleições é o índice de participação dos eleitores.