O
governo do Beto Richa, o mesmo que pôs fim a projetos como o Fera-ConsCiência, está armando mais uma contra os estudantes. Ele pretende alterar, sem nenhuma discussão, a matriz
curricular do estado. Da forma como está posta, disciplinas como
sociologia, filosofia, inglês, arte, ed. física, entre outras, correm o
risco de perder aulas para que possa serem aumentadas as aulas de língua portuguesa e matemática.
O interesse desta medida é que os estudantes paranaenses alcancem uma maior nota na prova do Ideb que os de outros estados. Como as disciplinas mais cobradas nessa avaliação são as de língua pátria e matemática, o governo pretende aumentar a carga horária dessas em detrimento de outras tão importantes quanto.
Precisamos sim de uma mudança na matriz curricular, mas uma mudança para melhor. Não do jeito que está sendo proposta.
A qualidade na educação se dá através de financiamento e políticas para o setor. Nada disso vem sendo feito.
O governo militar sabia muito bem da importância destas disciplinas a ponto de tê-las retirada do currículo nos anos de chumbo. Não deixaremos que o PSDB retome essa prática.
Venha conosco expressar nosso repúdio a essa atitude do governo do estado.
04/12/12
08:30 hrs
Saída: Pç. Rapouso Tavares
Para maiores informações, acesse:
Sociologia e Filosofia no
Ensino Médio:
Mais de Cem Anos de Luta
Sanderson Dias Bragança
O ensino de Sociologia no Brasil é marcado por um processo
pendular de inclusão e exclusão da disciplina no ensino
fundamental e médio. Fazendo uma breve análise cronológica,
podemos dividir esta história em três importantes períodos:
(1891-1941) período de sua institucionalização; (1941-1981)
período de alijamento e (1982-2001) período de retorno gradativo.
A interpretação desses dados torna evidentes dois vetores
influentes na inclusão ou exclusão das disciplinas de Sociologia
e Filosofia nos currículos escolares: o contexto histórico
e social; e o espírito de luta daqueles que acreditaram
e/ou acreditam que estas disciplinas têm um papel importante
e intransferível a desempenhar no ensino médio e fundamental
do Brasil.
INSTITUCIONALIZAÇÃO (1891-1941)
Ano de 1889. Proclamação da República. O ideal republicano
era latente entre os que assumiram o poder, o sentimento
de republicanismo e a necessidade de disseminar no país
uma nova idéia de nação, marcam o primeiro período da análise.Em
1891, pela primeira vez no Brasil é proposta na Reforma
Benjamim Constant, a disciplina de Sociologia no ensino
“secundário”.
O Brasil, ainda sob governo provisório, visava implementar
a laicização dos currículos de todos os níveis escolares,
e ainda, a constituição da identidade do “ensino secundário”
como momento de formação básica geral dos adolescentes.
A Sociologia surge neste momento não só como disciplina
indispensável a esses interesses, mas também como uma das
disciplinas obrigatórias e responsáveis pela preparação
de advogados, médicos, engenheiros, arquitetos (cursos intitulados
complementares) e professores (curso normal). A implantação
da Sociologia nesse período fundamentava-se pela crença
em seu pensamento renovador por parte daqueles que eram
os responsáveis pelos projetos pedagógicos nacionais, e
também pela convicção, por parte daqueles que lutaram pela
sua institucionalização de que tanto a Sociologia quanto
a Filosofia teriam muito a contribuir para o desenvolvimento
em seus jovens estudantes de um novo ideal de nação, de
progresso, de capacidade de interpretação e intervenção
em sua própria realidade, do pensamento crítico e da individuação.
ALIJAMENTO (1942-1981)
O segundo período tem suas configurações determinadas pelo
regime ditatorial que se inicia com a decretação do Estado
Novo em 1937, e pelo autoritarismo militar instaurado pelo
golpe de 1964. Em 1941 a Reforma Capanema retira a obrigatoriedade
da Sociologia nos cursos secundários, afora o curso normal.
Fato que demarca o início do segundo período.
Assim, tanto na ditadura Vargas quanto na ditadura militar,
foram utilizados mecanismos pedagógicos semelhantes, até
porquê, seus objetivos eram os mesmos, quais podemos resumir
como sendo: “formar indivíduos com espírito de patriotismo
e civismo, fortalecendo assim a unidade nacional e o culto
da obediência à lei”.
Desta forma, o papel da ciência na formação dos jovens brasileiros
neste período deveria ser somente o de possibilitar o domínio
de técnicas para a melhoria do processo de trabalho, e não
o domínio de técnicas de pesquisa para a investigação da
realidade social brasileira.
Sendo assim, a idéia difundida pela Escola Nova na década
de 20, de que a Sociologia no ensino “secundário” serviria
para a formação de indivíduos com capacidade de questionar,
investigar e compreender a realidade social foi, decerto,
assaz para que as autoridades educacionais dos regimes ditatoriais
decidissem pelo seu alijamento.
Deste modo, fica claro que a disciplina de Sociologia no
período ditatorial era, para as autoridades, mais do que
desnecessária, era impertinente, indesejável.
Embora neste período a Sociologia tenha se ausentado, os
trabalhos para sua reinserção no ensino médio não cessaram.
Em 1949, no Simpósio “O Ensino de Sociologia e Etnologia”
seu retorno foi defendi por Antônio Cândido. E em 1955,
no Congresso Nacional de Sociologia Florestan Fernandes
discute as possibilidades e os limites da Sociologia no
ensino médio.
RETORNO (1982-2001)
O último período da análise traz algumas curiosidades. Permanece
a luta pelo retorno, definitivo, na forma de disciplina
obrigatória, porque indispensável, tanto da Sociologia quanto
da Filosofia ao ensino médio. E com sensatez, rechaça-se
a idéia de “diluição” dos conteúdos de ambas ciências em
outras áreas do saber tais como a História e a Geografia,
disciplinas que se entende ser tão indispensáveis quanto
a Sociologia e a Filosofia, mas por suas especificidades,
não como um “sobrado” onde – como querem alguns – seriam
lançados de modo estéril teorias e conceitos sociológicos
e filosóficos. Não se preconiza a fragmentação do conhecimento,
muito pelo contrário, acredita-se não só na importância,
mas nas possibilidades da interdisciplinaridade e do trabalho
transversal dos temas-pilares seja da LDB, seja dos PCNs,
seja da UNESCO, que têm por fim, o exercício pleno da cidadania,
direito de todos. Contrários a fragmentação, a luta é marcada
pela tentativa de se oferecer aos educandos um ensino de
boa qualidade, e pelo desejo de garantir de modo institucional
enquanto cientistas sociais e por meio da educação, uma
cota de contribuição direta, empregando os conceitos, métodos
e tecnologias que são específicos às Ciências Sociais, no
processo de formação social do Brasil.
Contextualizando alguns fatos, com a abertura democrática
intensificaram-se as lutas pela Sociologia e Filosofia no
ensino médio, e importantes vitórias foram alcançadas. Em
1982 a Lei 7.044 de 18 de Outubro torna a optativa para
as escolas a profissionalização no ensino médio. Vale ressaltar
que em 1971 a Reforma Jarbas Passarinho tornou o ensino
médio profissionalizante, e retira a obrigatoriedade da
Sociologia na formação de professores, acabando assim com
qualquer possibilidade de atividade docente nesta área naquele
período histórico. Em 1986, a secretaria de educação do
estado de São Paulo, realizou concurso público para admissão
de professores de Sociologia, fato que resultara de toda
uma movimentação que ficou marcada pela mobilização da categoria
em torno do “Dia Estadual de Luta Pela Volta da Sociologia
ao 2º Grau” em 1983, promovida pela Associação dos Sociólogos.
E ainda, em Minas Gerais, a Universidade Federal de Uberlândia
incluiu, em 1997, a Sociologia, a Filosofia e a Literatura
como disciplinas constantes tanto do vestibular tradicional
como do PAIES (Programa Alternativo de Ingresso no Ensino
Superior). Outras vitórias, não menos importantes, também
vieram, caso do Rio de Janeiro (1989), Distrito Federal
(1985), Pará (1986), Pernambuco, Rio Grande do Sul, entre
outros estados, em que a disciplina de Sociologia passou
constar em seus currículos escolares.
As mencionadas curiosidades ficam por conta de que hoje,
não mais vivemos sob um regime autoritário, mas democrático,
que não necessariamente significa liberdade, haja vista
que o que caracteriza propriamente a democracia não é a
liberdade, mas o sufrágio. Temos então no poder não um déspota
ditador, mas um sociólogo, que não obstante, já entrou para
história política do Brasil como o Presidente que mais lançou
mão de medidas provisórias, uma das heranças do período
ditatorial. Muito embora seja possível relatar uma série
de curiosas incongruências, me deterei, para manter o foco
da análise, em recordar apenas a mais recente, o veto ao
projeto de lei que tornaria obrigatória as disciplinas de
Sociologia e de Filosofia no ensino médio. Veto este, que
se baseou em inconsistentes argumentos tais como a falta
de profissionais e o custo da medida, evasividade típica
de subterfúgios.
Longe de ser saudosista ou de fazer comparações descabidas,
e muito mais próximo de tentar ser animador, recordo as
batalhas travadas por ícones das Ciências Sociais. Durkheim,
imortalizado por obras que são, sem dúvida alguma, cânones
da Sociologia, lutou intensamente pelo espaço que hoje esta
dispõe no meio acadêmico e científico. Sua principal obra,
“As Regras do Método Sociológico”, foi a responsável pela
convulsão interdisciplinar que golpeou inapelavelmente seus
adversários, e finalizou seu trabalho de ruptura, fundação
e conquista. Num período histórico não muito favorável,
Durkheim foi arrojado. De uma só vez, descreveu o método,
e definiu a Sociologia como sendo “esse modo de pensar que
se declara disposto a penetrar o desconhecido”. Ressalta
a obrigatoriedade de nos afastarmos das “prenoções”, e de
nos despedirmos das nossas habituais maneiras de “pensar,
sentir e agir”. Peremptoriamente, o método sociológico,
declara Durkheim, é esse “ponto de vista disciplinador”,
é exilar-se de si mesmo. À guisa de complemento, nas décadas
de 20 e 30, personagens como Gilberto Freire, Fernando de
Azevedo, Delgado de Carvalho, Roger Bastide, Donald Pierson,
Carneiro Leão, também lutaram e foram vitoriosos, neste
caso, pela “introdução da Sociologia no ensino secundário
e normal e pela mobilização favorável a fundação dos cursos
superiores de Ciências Sociais na Universidade de São Paulo
e na Universidade do Distrito Federal” (1). Conquanto
tenha sido citado anteriormente, é válido relembrar que
atualmente êxitos consideráveis também foram consubstanciados.
E é muito importante perceber a presença de associações,
de grupos de trabalho, de colegiados, de alunos, de professores,
de políticos e demais tributários nesta luta.
Não tenho aqui a intenção de discutir questões ideológicas,
ou de defender ou criticar a validade de quaisquer métodos.
Não levanto bandeira neo-durheimiana, muito menos se trata
de tentar mitificar outros intelectualmente respeitáveis
cientistas sociais. Tenho apenas a intenção de trazer a
memória, que as lutas, fazem parte da história das Ciências
Sociais, e suas vitórias, estão descritas em muitas de suas
páginas. A luta de hoje é tão honrosa, quanto outras que
passaram, e decerto, quanto outras que virão. Não chegou
a ser um golpe (inapelável como o de Durkheim aos seus adversários),
o veto por parte do nosso Presidente. Para alguns, o veto
já era até esperado. Muitos ressaltam a contradição de um
sociólogo vetar a inclusão da Sociologia e da Filosofia
no ensino médio, e têm razão, pois embora a contradição
seja uma força propulsora e pertinente às Ciências Sociais,
lhe é também traço marcante o seu caráter discursivo, e
nos estranha não no Presidente, mas no sociólogo, tamanha
pobreza de argumentos. É difícil decidir o que é pior, se
acreditar que realmente se trata de debilidade na construção
e verbalização dos motivos que levaram ao veto, ou se o
que vimos representa nada menos que o mais completo descaso.
Marx escrevera em “O Dezoito Brumário” que “os homens fazem
sua própria história, mas não a fazem como querem; não a
fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas
com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas
pelo passado”. Os homens a que Marx faz referência representam
as classes, que em conflito movimentam a história, e fazem
acontecer. Quando as classes evitam o confronto, Marx afirma
se tratar de um período improdutivo, “sem relevância” da
história, marcado por “paixões sem verdade, verdades sem
paixões, heróis sem feitos heróicos, história sem acontecimentos;
desenvolvimento cuja única força propulsora parece ser o
calendário (...)”. As “circunstâncias” sob as quais se encontra
a luta de hoje, não foram escolhidas, mas são as que se
deve defrontar diretamente. Assim, cabe fazer uma pergunta:
Qual a história de amanhã que hoje se pretende fazer acontecer?
(...).
Tornar obrigatório o ensino de Sociologia e de Filosofia
no ensino médio, é tão importante quanto sua legitimação
por parte da sociedade, outro desafio que gradativamente
vem sendo superado. Mais do que ornamentações pedagógicas,
ou meros limbos curriculares, a docência destas disciplinas
vem para contribuir de modo específico e peculiar junto
às demais disciplinas para construção de uma sociedade reflexiva,
investigadora de seu meio, e capaz de problematizar sua
própria realidade. Decerto não só é possível, embora não
simples, mas imprescindível, apresentar aos educandos esse
“modo de pensar, de sentir e de agir”. Não se trata de querer
formar sociólogos no ensino médio, muito menos no fundamental.
No entanto o que se tenta não é nada impossível ou utópico,
pois a Sociologia e/ou a Filosofia não têm a pretensão de
ser (como acreditava Mário de Andrade, entre outros pensadores
em meados da década de 20/30) “a arte de salvar rapidamente
o Brasil”. As intenções não são tão ambiciosas, ou absurdas.
Busca-se somente, empregando seus conceitos e métodos apenas
facilitar e possibilitar ao educando, que ele consiga despertar
em si mesmo um novo foco de seu próprio meio, e daí exercitar
o início de um pensamento crítico e/ou reflexivo que o leve
a perceber em alguns antes desimportantes detalhes, fatos
ou frases, as contradições, as desigualdades, a realidade
a sua volta e que assim ele possa se perceber em seu grupo,
como parte deste grupo, se individuar, se compreender e
compreender as diferenças, busca-se não mais que favorecer
a cidadania, a tolerância, a coesão e o desenvolvimento
social.
A história de amanhã que se tenta escrever hoje, é a de uma
comunidade coesa, de uma sociedade que compreende suas
diferenças, que é capaz de problematizar seu meio, que
luta por seus ideais próprios de progresso, pela cidadania,
e contra a intolerância, o individualismo e o etnocentrismo.
A Sociologia e a Filosofia vêm com o modesto, porém probo
intuito de trabalhar junto às demais disciplinas para
o desenvolvimento do educando, e da comunidade. Para alcançar
o que se almeja não há truques, e nem se desdobrará por
encanto. A luta prossegue, e a cidadania agradece.