sábado, 15 de junho de 2013

Comitê Municipal Contra a Redução da Maioridade Penal no município de Maringá/PR

Formação do Comitê Municipal Contra a Redução da Maioridade Penal no município de Maringá/PR, realizado dia 12 de Junho, no auditório Hélio Moreira, na PMM.Estiveram presentes representantes da UJS, da UMES, do Grêmio Estudantil do IEEM, da PJ, do CMDCA, MNDH, vereadores, conselheiros tutelares.

 


João Vitor (Fórum DCA/PR); Eva (Movimento Nacional de Direitos Humanos); Carlos Mariucci (vereador/maringá); e Fabiana (União Maringaense de Estudantes Secundaristas - UMES)... Um papo descontraído sobre o papel das conferências e a atuação dos movimentos sociais.


Redução da maioridade é linchamento

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O crime cometido recentemente por um jovem na cidade de São Paulo – o assassinato de um estudante cometido por um ladrão que estava às vésperas de completar 18 anos de idade – provocou forte comoção, recolocou na pauta da mídia conservadora o debate sobre a redução da maioridade penal (que a Constituição fixa em 18 anos de idade), e teve uma resposta oportunista do governador tucano de São Paulo Geraldo Alckmin, que apresentou ao Congresso Nacional um projeto que prevê punições mais duras para jovens que cometam crimes.

Ninguém pode ignorar que a delinquência juvenil é um grave problema. Seu enfrentamento provoca polêmicas e envolve desde o clima emocional decorrente de crimes brutais, como o ocorrido em São Paulo, até convicções políticas e ideológicas daqueles que se envolvem no debate.

A percepção popular da gravidade da questão fica evidente nas pesquisas de opinião feitas em ocasiões de forte comoção. A mais recente, feita na cidade de São Paulo logo depois daquele crime, mostrou que 93% dos paulistanos são favoráveis à redução da maioridade penal. Há entre eles um número considerável (9%) para quem o ideal seria reduzir para 12 anos de idade!

Mas é uma resposta simplista para o problema, disse o juiz Luís Fernando Vidal, do Tribunal de Justiça de São Paulo. “Aumentar o rigor da lei é uma medida de caráter simbólico que não resolve nada”, sendo “uma resposta pronta e fácil” que, segundo ele, não aplaca a dor da família da vítima nem resolve o problema da sociedade.

Trata-se de uma opinião amplamente compartilhada pelos juízes que, reunidos em Vitória (ES), entre 11 e 13 de abril, no 13º Fórum Nacional da Justiça Juvenil, aprovaram a Carta de Vitória em Defesa de Responsabilidade onde dizem que o “problema da violência é cercado de grande complexidade e não será resolvido por soluções simplistas como o mero endurecimento das legislações punitivas”.

Os magistrados abordaram a questão central. As estatísticas mostram o agravamento da delinquência juvenil; na última década, o número de adolescentes infratores punidos com privação de liberdade praticamente dobrou, passando de 8.579 para 17.703 (os dados são da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República).

Os crimes cometidos por eles (sobretudo roubos – o percentual de homicídios é de 1,5% do total) já têm punições previstas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que prevê desde privação de liberdade até medidas socioeducativas que variam de acordo com a gravidade das infrações e têm o objetivo de ressocializar os jovens infratores.

Os jovens são os pararraios da sociedade, é neles que os males sociais aparecem com maior visibilidade. São pessoas em formação que refletem os valores predominantes, as carências mais sentidas, a existência (ou não) de políticas públicas específicas. Hoje, falta educação em tempo integral e programas de formação e lazer para os jovens, que constituem o setor mais frágil das situações de pobreza, relegados muitas vezes à fronteira do mundo do crime, do contato com gangues e traficantes ou da exploração sexual.

“Olhemos para a nossa própria realidade: famílias vivem amontoadas em cubículos insalubres porque os programas habitacionais ainda não garantem moradia digna; não temos vagas suficientes nas creches para as famílias deixarem as crianças em segurança enquanto trabalham; não há escolas de tempo integral suficiente para as crianças do ensino fundamental; o atendimento de saúde ainda é deficiente, faltam médicos e medicamentos, não há vagas para tratamento de usuários de drogas e a política de enfrentamento desse problema de saúde pública ainda está em construção; não se reconhece que o acesso à cultura e lazer é importante para afastar os adolescentes da marginalidade”, disse a juíza Katy Braun da Vara de Infância, Juventude e do Idoso em Campo Grande (MS).

Ela descreve com cores vívidas uma sociedade que não é saudável. Os conservadores, como sempre, jogam a responsabilidade sobre os ombros do indivíduo, mesmo que sejam crianças e adolescentes em processo de formação. O “mal”, em sua opinião, é intrínseco à natureza humana, e pensam que é no indivíduo que deve ser combatido. Esta forma de ver despreza o papel da sociedade, do coletivo, na formação de cada um dos seres humanos existentes. Para quem pensa dessa maneira existiria uma natureza humana fixa e imutável, mas que pode adaptar-se à civilização reprimindo seus instintos agressivos. Esta opinião conservadora é conveniente para aqueles que, decretando essa imutabilidade dos seres humanos, querem na verdade manter imutável a sociedade com suas injustiças e privilégios para um pequeno grupo.

O pensamento progressista vê a realidade humana e social de outra maneira. Quer avançar e conquistar condições de igualdade e justiça entre as pessoas. Os desajustados, que cometem crimes, precisam ser punidos, claro. Mas punir não é vingar, e as medidas punitivas não constituem o linchamento social pretendido pelos que clamam por mais rigor da lei.

A juventude precisa de políticas que lhes deem oportunidades e alternativas para que se afirme na sociedade. É preciso ampliar as políticas de prevenção e as alternativas, apoiar e aprovar o Plano Nacional de Educação e fazer valer o Estatuto da Criança e do Adolescente.


10 razões porque somos contra a redução da maioridade penal

1. Culpabilização do adolescente.
As estatísticas (1) demonstram que apenas 0,2% dos adolescentes (entre 12 e 18 anos) estão cumprindo alguma medida sócio-educativa no Brasil por terem cometido crimes. Isso prova que a criminalidade não é maior nesta faixa etária, ou seja, não há um problema específico relacionado à maioridade penal.

2. Desvio do foco das verdadeiras causas.
A discussão sobre maioridade penal desvia o foco das verdadeiras causas do problema da violência, colocando a culpa no adolescente. As pesquisas (2) realizadas nas áreas social e educacional apontam que no Brasil a violência está profundamente ligada a questões como: desigualdade social (diferente de pobreza!), exclusão social, impunidade (as leis existentes não são cumpridas, independentemente de serem “leves” ou “pesadas”), falhas na educação familiar e/ou escolar principalmente no que diz respeito à chamada educação em valores ou comportamento ético, e, finalmente, certos processos culturais exacerbados em nossa sociedade como individualismo, consumismo e cultura do prazer.

3. Reações emocionais motivadas pelas “más notícias” veiculadas pela mídia.
Em geral, quando tomamos conhecimento de histórias de crimes bárbaros cometidos por jovens, temos naturalmente um sentimento de indignação, que por sinal é muito justificado. Porém, quando tomamos contato com números que mostram que apenas 2 em cada 1000 adolescentes se envolvem em crimes, podemos relativizar esta indignação e não generalizá-la a todos os jovens, uma vez que esses crimes bárbaros, apesar de serem chocantes, são casos isolados.

4. Crença de que as leis mais “pesadas” resolvem o problema.
Muitas vezes imaginamos que leis mais rigorosas poderiam combater a violência e melhorar a situação brasileira. Mas essa idéia certamente é equivocada, uma vez que encontramos vários exemplos históricos e atuais de regimes extremamente rígidos em diversos países, que ainda assim não conseguiram reduzir ou resolver o problema da violência. Na verdade, não precisamos de leis mais rígidas, mas sim de rigor e ética no cumprimento das leis que já existem. Sem contar que no Brasil é muito comum haver injustiça e preconceito na aplicação das leis. Pobres e negros lotam os presídios enquanto políticos corruptos continuam no poder, abusando dos seus privilégios. Se as leis forem mais rígidas, obviamente essa rigidez também afetará automaticamente o setor excluído da sociedade e não as camadas dominantes. Sendo mais claro: da forma como estamos, se um adolescente pobre cometer um crime certamente será preso, mas dificilmente um filho da elite sofrerá a mesma punição.

5. Satanização da adolescência pela sociedade.
Quando queremos reduzir a maioridade penal parece que há um discurso implícito que diz mais ou menos o seguinte aos adolescentes: “nós desconfiamos de vocês… se não andarem na linha, nós vamos puní-los com rigor!” Ou seja, passamos a cultivar um espírito de desconfiança, tratando os adolescentes como se fossem nossos inimigos. No entanto, sabemos que a adolescência é uma fase em que o ser humano é tomado por diversos conflitos e um forte sentimento de insegurança, de maneira que nossa desconfiança pode ter o poder de acentuar ainda mais as dores de um período por si só doloroso. Precisamos valorizar o jovem, considerá-los como parceiros na caminhada para construção de uma sociedade melhor, e não como vilões que estão colocando a nação em risco.

6. Crença de que os jovens terão medo da punição e cometerão menos crimes.
Por que temos medo de receber uma punição como a prisão? Certamente porque gostamos de viver a vida em liberdade, temos uma boa rede de afetos (família e amigos), temos uma rotina que de alguma forma tem atividades estimulantes, das quais não queremos abrir mão. Então, se um adolescente tiver auto-estima baixa, pouca referência afetiva e uma vida muito difícil, será que ele vai se importar com um punição mais rigorosa? Será que terá tanto medo quanto nós temos, a ponto de deixar de fazer alguma coisa para não ser punido? E não são justamente estes adolescentes que cometem crimes mais graves, os que já não têm uma vida digna a prezar? Muitos já arriscam a própria vida todos os dias convivendo com traficantes, chefes de quadrilhas e gangues, então, por que então terão medo da lei? As punições só podem causar medo e impedir o crime quando aprendemos a gostar de viver e sentimos a necessidade de lutar pela vida que ganhamos e construímos. Até mesmo a morte não causará medo em pessoas que não têm perspectiva.

7. Crença de que a prisão educa.
Reduzindo a maioridade penal, adolescente vão para a prisão. E daí? Depois de tudo o que sabemos sobre as condições dos presídios brasileiros, como ainda acreditamos que um adolescente poderá aprender alguma coisa e se reeducar num sistema que não oferece nenhuma condição de educar ninguém?

8. Crença de que a lei atual é “mole” e o ECA enfatiza apenas os direitos.
Para quem pensa desta forma, o desafio é ler o Estatuto da Criança e do Adolescente. Esta lei foi criada para proteger os menores de 18 anos de comportamentos gravíssimos cometidos por adultos, como negligência, espancamento e abuso sexual. Mas, ao mesmo tempo que protege, garantindo os direitos, a lei também exige os deveres e prevê reparações de erro, trabalho comunitário, tratamento e até mesmo privação de liberdade para o caso de jovens em conflito com a lei. Assim, mais uma vez o problema não é a lei que é frouxa, mas o fato das leis existentes não serem cumpridas ou serem cumpridas de maneira inadequada. Muitos adolescentes que são privados da sua liberdade, por exemplo, não ficam em instituições efetivamente preparadas para reeducar estes jovens e acabam reproduzindo o ambiente de uma prisão comum. Um ambiente adequado para cumprimento de medidas sócio-educativas precisa contar com profissionais preparados e recursos adequados para recuperar o ser humano.

9. Dificuldade de admitirmos a nossa parcela de responsabilidade.
O ser humano, em geral, tem a tendência de olhar muito facilmente a culpa do outro, o erro do outro, o mal que o outro causa, e uma imensa dificuldade em olhar para si e enxergar a sua própria culpa, os seus próprios equívocos, o seu próprio mal. É a velha e sábia história: olhamos para o cisco no olho dos outros e não retiramos o cisco que se encontra em nossos próprios olhos. Assim, defendendo a redução da maioridade penal corremos o risco de olhar apenas para o adolescente e esquecer o nosso próprio egoísmo, nossa falta de solidariedade, nossa indiferença social, nosso consumismo, nossa ostentação… fatores que reforçam a desigualdade social e contribuem para deixar os jovens mais desamparados e perdidos em termos de valores. Não podemos simplesmente querer punir jovens que cometem crimes sem lembrar que dos pequenos crimes de descaso que cometemos no dia-a-dia.

10. O ódio em alta.
O perdão e o amor em baixa. Este é o ponto mais difícil de ser tratado porque mexe com áreas muito profundas do nosso ser. Certamente a indignação causada pelas notícias de jovens que cometem crimes nos levam facilmente ao ódio e o ódio nos leva a procurar uma forma de vingança, despertando o desejo de dar uma punição extremamente rigorosa aos criminosos. Quando pensamos do ponto de vista da vítima, imaginando o sofrimento pelo qual passou e a dor que atingiu a família, é quase natural que esse ódio seja reforçado. Porém, apesar de difícil, vale a pena o exercício de tentar pensar no lado do criminoso. Um jovem que comete um crime bárbaro tem sua vida marcada para sempre (sua consciência e o julgamento da sociedade são cruéis); uma vida que poderia ter se tornado mais um brilho para dar luz ao mundo, foi apagada; uma energia que poderia ajudar na transformação do mundo foi interrompida; uma chama criativa que poderia contribuir para melhorar a raça humana, foi extinta, talvez para sempre. Se pensarmos assim, talvez encontremos um espaço para a compaixão e o perdão… porque a vida que fica talvez não sofra menos do que a vida que se foi… Além disso, quando assistimos um jovem que se envereda pelos caminhos tortuosos da criminalidade, de certa forma nos deparamos com nosso próprio fracasso enquanto sociedade… fracasso por não termos conseguido conduzir uma vida para sua realização plena e ética, enquanto ser humano.